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Adoção: Avós podem adotar os netos?

Cresce a importância da participação dos avós na vida dos netos. Convivência, guarda e até o pagamento de pensão alimentícia são tarefas relevantes na relação entre as gerações.
Adoção Avós podem adotar os netos

Olá a todos,

No artigo de hoje vamos conversar um pouco sobre diferentes aspectos de uma relação pouco mencionada, mas que é muito importante para o desenvolvimento das crianças: a adoção e a relação das crianças com os avós.

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Eu tive a minha Nonna até meus 25 anos, ela me ensinou a cozinhar desde os meus 13 anos, aprendi várias músicas tradicionais italianas que ela cantava enquanto lavava roupa, enfim foram experiências incríveis e marcantes.

Mas infelizmente minha mãe não viveu a tempo de conhecer meus filhos e eu sei que isso deve estar causando lacunas na vida deles em relação aos vínculos familiares.

Do mesmo modo, a avó nigeriana, mãe do meu marido, faleceu exatamente no dia do meu aniversário no ano passado, já estava muito doente e debilitada, e não tivemos condições financeiras de estarmos lá, devido ao elevado preço das passagens aéreas.

E sempre temos em nossa formação a certeza de que os avós são elementos importantes na nossa vida.

Em 10/03/2020, a 4ª. Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que avós podem adotar o neto, em nome do melhor interesse da criança, contrariando o recurso do Ministério Público (MP) de Santa Catarina, que alegou a proibição do ato em função do art. 42, § 1º do Estatuto da Criança e do Adolescente[1] (ECA, 1990).

No máximo, os avós podem exercer a guarda física, mas não adotar. No processo, os pais da criança foram ouvidos e manifestaram concordância com a adoção pela avó paterna e pelo companheiro dela (avô ‘por afinidade’).

Essa decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça (TJ) de Santa Catarina, e apesar do recurso do MP ao STJ, o Ministro Luis Felipe Salomão rejeitou os argumentos do MP e reconheceu que há exceções que podem ser benéficas ao melhor interesse da criança:

  • o pretenso adotando seja menor de idade;
  • os avós (pretensos adotantes) exerçam, com exclusividade, as funções de mãe e pai do neto desde o seu nascimento;
  • a parentalidade socioafetiva tenha sido devidamente atestada por estudo psicossocial;
  • o adotando reconheça os adotantes como seus genitores e seu pai (ou sua mãe) como irmão;
  • inexista conflito familiar a respeito da adoção;
  • não se constate perigo de confusão mental e emocional a ser gerada no adotando;
  • não se funde a pretensão de adoção em motivos ilegítimos, a exemplo da predominância de interesses econômicos; e
  • a adoção apresente reais vantagens para o adotando.

Porém, há necessidade de análise de cada caso, uma vez que existem situações em que a participação dos avós na vida dos netos não se mostra tão benéfica assim.

  • Há casos em que avós falam mal e criticam os genros/noras (pais da criança) e até os próprios filhos na frente da criança, ou permitem que ela ouça as críticas;
  • Também há avós que têm comportamentos reprováveis, como assistir filmes pornográficos ou ter revistas pornográficas à vista das crianças;
  • Alguns vão além dos “mimos” aos netos, e contrariam de propósito os princípios educacionais estabelecidos pelos pais;
  • Há avós que negligenciam os cuidados com as crianças; há avós que incutem preconceitos (ex.: contra negros, deficientes) nas crianças;
  • Têm avós que reclamam da vida e se fazem de “vítima” para a criança, fazendo com que ela se sinta culpada e impotente por não poder “ajudá-los”, o que pode gerar ansiedade, angústia e depressão na criança;
  • Discriminações, ridicularizações ou hostilizações podem surgir entre avós e os netos por alguma característica (ex.: ser baixo, gordo, deficiente);
  • Avós também podem praticar atos de Alienação Parental, denegrindo a imagem do(a) ex-cônjuge do(a) filho(a), e induzindo a criança a formular falsas acusações de abuso sexual e/ou agressão física contra ele(a).

Avós podem pagar pensão alimentícia?

Outra questão relevante diz respeito à convocação dos avós para que prestem obrigação de pagamento de pensão alimentícia.

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De acordo com o artigo 1.698 do novo Código Civil (CC), demandada uma das pessoas obrigadas a prestar alimentos, poderão as demais ser chamadas a integrar o feito.

Então, se o pai alimentante deixar de pagar total ou parcialmente a pensão, poderão os avós ser chamados a cumprir tal obrigação.[2]

O STF também entende que os avós maternos podem também ser incluídos como responsáveis pelo pagamento de pensão alimentícia para os netos.[3]

Outra questão importante se refere ao relacionamento dos avós com os netos após a separação dos filhos.

Para DOLTO (2003, p. 91-92), os pais devem se comportar como adultos e por isso o retorno à casa de “papai e mamãe” é uma regressão, tanto para os próprios filhos separados/divorciados, que deixam de ser modelos de adultos para as crianças, como para as próprias crianças, que passam a tratar o pai/mãe separado(a) como “irmão(ã) mais velho(a)”.

Segundo a autora, “quando a mãe volta para a casa dos pais com o filho, este tende a substituir o pai ausente, seu pai, pelo pai de sua mãe, e a se sentir, desse modo, filho do avô”.

DUARTE (2012, p.13) entende que, para dirimir quaisquer dúvidas, o juiz deve se basear não apenas na letra fria da lei, mas também nas ponderações de um psicólogo que procure entender as razões daquela criança e o que está acontecendo, bem como no apoio do assistente social que faça um retrato das condições em que vive aquela família.

A autora questiona (2012), qual o lugar da criança diante dessa diversidade de relações familiares (em perguntas simples, mas de respostas complexas como: “os pais da namorada do meu pai são meus avós?”, ou “os filhos do namorado da minha mãe são meus irmãos?”).

Inclusive, LUDWIG (2013) traz uma questão interessante: diante das novas configurações familiares, além dos padrastos e madrastas, surgem também as figuras dos “avósdrastos”, ou seja, avós por afinidade dos enteados de seus filhos.

E, nesse caso, existe a obrigação alimentar desses “avósdrastos”?

Por enquanto, o autor esclarece que não foram trazidas questões dessa natureza do Judiciário, mas em breve podem chegar, e o Judiciário terá que se posicionar a respeito, a partir do Princípio do Afeto.

Esse princípio privilegia a afetividade acima da consanguinidade, principalmente em situações em que os “netosdrastos” convivem muito mais com os “avósdrastos” do que com seus avós biológicos…

Enfim, cuidemos dos nossos avós!

Até porque um dia também seremos avós e vamos receber dos nossos filhos e netos os mesmos cuidados e atenção que tivermos com eles, uma vez que, consciente ou inconscientemente, somos modelos para as próximas gerações!

Espero que tenham apreciado o artigo e que traga importantes esclarecimentos e reflexões.

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Até a próxima!

Referências Bibliográficas:

BRASIL. Congresso Nacional. Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei 8.069/90, 13/07/1990.

DOLTO, Françoise. Quando os pais se separam. 3 ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2003.

DUARTE, Lenita P acheco L. A guarda dos filhos na família em litígio. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012.

LUDWIG, Frederico Antonio Azevedo. O princípio do afeto e a relação entre avós e netos por afinidade. Âmbito Jurídico, Rio Grande (RS), abr. 2013. Disponível em: . Acesso em: 16 abr. 2013.

MIGALHAS. STJ: 4ª turma autoriza adoção de neto por avós em atenção ao melhor interesse da criança. Ribeirão Preto, 10/03/2020. Disponível em: https://m.migalhas.com.br/quentes/321469/stj-4-turma-autoriza-adocao-de-neto-por-avos-em-atencao-ao-melhor-interesse-da-crianca. Acesso em: 10 mar. 2020.

SCHEER, Genaro Costi. A relativização da responsabilidade alimentar avoenga. Jus Navigandi. Teresina, ano 16, n. 3030, 18 out. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20244/a-relativizacao-da-responsabilidade-alimentar-avoenga/2. Acesso em: 24 set. 2012.

SILVA, Denise Maria Perissini da. Psicologia Jurídica no Processo Civil Brasileiro. 4. ed. Curitiba: Juruá, 2019 (vols. 01 e 02).

[1] ECA – Lei nº 8.069 de 13 de Julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências.

[2] Complementação de pensão pelos avós paternos e maternos. AASP, 22/03/2011. Disponível em: http://www.aasp.org.br/aasp/noticias/visualizar_noticia.asp?id=32028&tipo=D.

[3]              FALCÃO, M.; GUIMARÃES, L. Avós devem dividir pensão não paga, segundo decisão do STJ. Folha.com, 30/03/2011. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/895879-avos-devem-dividir-pensao-nao-paga-segundo-decisao-do-stj.shtml.

Indicação de leitura

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Sobre o autor(a)

Denise M. Perissini

Denise M. Perissini

Psicóloga clínica e jurídica. Coordenadora da Pós Graduação em Psicologia Jurídica na UNISA e professora na UNISÃOPAULO. Autora de livros e artigos de Psicologia Jurídica de Família.
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